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Brasil / África

Preto e branco em cores, a arte de Alexandre Keto
por Mario Bentes

 

 

Ao longo de sete dias, já depois de ter os cabelos raspados e ter passado por um período de recolhimento, o iniciado na prática do Candomblé terá seu corpo inteiro pintado com um tipo de giz branco, como parte de uma série de rituais que o farão um santo – um yàwó. O giz chama-se Efun, e é parte do rito de passagem, de transformação dessas pessoas. Ao fazer um paralelo do ritual de iniciação do Candomblé com a história de vida do artista plástico paulistano Alexandre Keto, faz todo o sentido que sua primeira exposição em sua cidade natal tenha justamente levado o nome “Efun”. Ele próprio passou por um tipo de transformação ao se dar conta que seu trabalho poderia ir além do contexto visual, isolado em si mesmo, para ganhar ares de “intervenção direta ao ser humano”.

 

 

 

 

Keto começou a desenhar e pintar ainda na infância, em São Paulo. Mais tarde, por meio de um projeto social em seu bairro, no Parque São Lucas, Zona Leste da capital, o artista conheceu o graffiti e todo o contexto ligado a ele: o Hip Hop, a linguagem predominantemente urbana e as questões sociais, com suas reivindicações e buscas por soluções. Foi quando ele entendeu que seu fazer artístico poderia ser uma ferramenta de transformação da realidade. “Ao ver o impacto do meu trabalho, pude perceber que o que era minha paixão adaptada à minha realidade também poderia despertar sentimentos. E mais do que adaptar, transformar e intervir na realidade das pessoas que entravam em contato com ele. Saber disso foi transformador, pois me despertou uma ambição que ultrapassa o fato de ter exposições e trabalho com uma estética apreciada por críticos de arte: o desejo de transformar através dessas intervenções as realidades que cruzam com a minha, compondo uma sociedade”, explicou Keto, ao Afreaka.

 

 

 

 

“Eu acredito no papel da arte como uma ferramenta de transformação, que possibilita esta intervenção direta ao ser humano, que abra horizontes e transcenda em muitos aspectos vitais. Mas de uma forma real e acessível para que isso seja eficaz às pessoas”, prossegue. O paralelo da trajetória pessoal do artista com o sentido do “Efun” vai além. A temática africana, com seus rituais, crenças, elementos místicos e conjunturas sociais fazem parte da lista de referências do trabalho de Keto. “Efun”, que permaneceu em exposição gratuita em São Paulo em dezembro do ano passado, reunia trabalhos do artista que representavam as pinturas feitas com o giz branco do rito de iniciação do Candomblé. Keto já trabalhava inserido em projetos sociais quando ainda morava em São Paulo, explorando a arte em graffiti com jovens da periferia da Zona Norte da cidade. Em 2011, por conta desse trabalho, ele recebeu um convite para participar do Fórum Social Mundial, no Senegal, país da África Ocidental. Em Dakar, o artista se viu diante de tudo aquilo sobre o qual já lia e pesquisava: a arte africana nua, em cores vivas e suas formas abstratas – “de uma forma materializada e encantadora”, segundo ele mesmo explica.

 

 

 

 

Apenas três meses depois do evento, Alexandre Keto retornou ao país por meio de outro projeto social, e dali não parou mais. Nesse meio tempo, em visitas a outros cinco países daquele continente, ele ajudou a realizar intercâmbios de outros artistas brasileiros com países africanos, e vice-versa. Em 2014, há novas visitas agendadas. A série de viagens aos países africanos, com a íntima troca de influências recíprocas, tem influenciado bastante o trabalho do grafiteiro: “Todos os elementos, formas e cores que eu utilizo no meu trabalho é resultado das minhas pesquisas sobre grupos étnicos africanos. A mulher está sempre presente em meu trabalho, primeiro pela admiração às mulheres em geral, e em segundo pelo poder de gerar a vida, que é onde está a esperança. A mensagem é relativa, mas em todo trabalho eu espero dividir a minha pesquisa somando para a valorização da matriz africana em nossa vida”.

 

 

Explicando que a base de seu trabalho é a cultura africana e uma pesquisa sobre grupos étnicos do continente, que então são transformados em graffitis com fortes mensagens, Keto conclui: “Acredito que nós brasileiros, independente do tom de pele, temos tanto sangue europeu como sangue africano, mas o meu sangue africano pulsa mais”.