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Quênia

Umoja: a união onde homens não entram
por Alê Alves

 

Localizado no norte do Quênia, Umoja é um vilarejo habitado somente por mulheres vítimas de diferentes abusos e violências. (Foto: Reprodução Filckr/Wouter van Villet )

 

 

Os colares de miçangas coloridas marcam o pertencimento ao povo Samburu (http://www.afreaka.com.br/povos-do-norte/), guerreiros e pecuaristas que vivem no norte do Quênia, se espalhando até a fronteira com a Etiópia. Vestidas com trajes tradicionais, saias estampadas e uma espécie de canga amarrada aos ombros, as mulheres de Umoja realçam as cores da região, aquarelando uma área marcada pelo ar seco e sol desgastante.

 

 

Localizado no norte do Quênia, Umoja é um vilarejo habitado somente por mulheres vítimas de diferentes violências físicas, como agressões e casamentos forçados. Criado por quinze sobreviventes aos abusos cometidos por oficiais ingleses no ano de 1990, o povoado Umoja hoje tem pelo menos o triplo do número de mulheres que havia em sua fundação.

 

 

Já se passaram 20 anos desde a sua criação e, de lá para cá, muita coisa mudou. Se antes o cotidiano das mulheres era acordar muito cedo, cuidar dos filhos, dos afazeres domésticos e das poucas trocas comerciais que ocorrem na região, agora em Umoja as mulheres fazem de tudo.

 

 

Se, ao chegarem ao vilarejo, a maioria delas possui algumas poucas vestes, ao serem acolhidas, elas podem comprar roupas com os recursos vindos do turismo. Se antes eram integrantes de uma sociedade governada tradicionalmente pelos (homens) mais velhos, hoje essas mulheres possuem as terras, trabalham para si próprias e tem o seu próprio dinheiro conquistado a partir da venda de colares e outros enfeites que produzem. Se continuavam em casa quando submetidas a violências e abusos, por não terem para onde ir, hoje Umoja, que significa”unidade” em suaíli, traz a essas mulheres possibilidades outras além de sobreviver.

 

 

 

(Foto: Reprodução Flickr/Joachim Huber)

 

 

O  cotidiano

As mulheres que vão a Umoja recomeçam a vida parindo suas próprias casas. Munidas de madeira, vegetação, barro e a ajuda de outras mulheres, as recém-chegadas erguem o lugar onde passam a morar com os filhos que trazem. Além da auto-organização e da quebra de tradições, as mulheres de Umoja se destacam ao oferecer treinamento e conversas sobre tabus, como mutilações genitais e casamentos forçados, a mulheres e garotas que vivem nos arredores do vilarejo.

 

 

Um exemplo disso são alguns vilarejos vizinhos como Nachami, Supalake e  Nang’Ida – onde, mesmo com a convivência entre os dois gêneros, vem ocorrendo a quebra de algumas tradições do povo Samburu,  como o direito do homem casar com mais de uma mulher.

 

 

Em uma sociedade onde a criação e o abatimento de animais são restritos exclusivamente aos homens, as mulheres de Umoja rompem a tradição ao criar cabras, cuja carne constitui a base da alimentação da vila. Outros alimentos essenciais, como arroz e milho, são comprados em Archers Post, uma pequena cidade situada a 9 Km de Umoja.

 

 

Umoja possui ainda uma escola, gratuita e coordenada pelas moradoras, que também atende crianças de outros vilarejos. Por dia, uma média de 80 crianças vão para a escola e, sob tutela de uma única professora, têm cursos em três idiomas: samburu, kiswahili e inglês. que permaneceu como língua oficial após independência, em 1963, e é obrigatório no ensino primário.

 

 

Por causa dos índices de baixa escolaridade local, a ideia é partilhar o conhecimento a fim das crianças serem alfabetizadas. O baixo acesso das meninas às escolas aumenta as chances delas ficarem restritas somente ao ambiente doméstico e, posteriormente, serem forçadas a casamentos precoces.

 

 

Conversas e a construção de novas relações

Além de um novo endereço, o renascimento em Umoja, ocorre também pela partilha de experiências comuns. É durante o café da manhã, a busca por água ou a elaboração dos artesanatos que as mulheres conversam sobre o que viveram.

 

 

As mulheres de Umoja são livres para decidir se querem permanecer solteiras ou iniciar outros relacionamentos. As que optam pelo segundo caminho, devem sair da vila e ter encontros pela noite. Se engravidarem, trazem a(o) bebê para o vilarejo.

 

 

Não gritar e respeitar umas às outras é uma das normas que regem a vila. Além de construírem um lugar auto-organizado, Umoja busca a criação de relações pautadas pelo respeito e por uma convivência  saudável. Apesar de dificuldades materiais, o desenvolvimento de autonomia e a ampliação das possibilidades de escolha tiram Umoja das estatísticas de violência e de morte.

 

 

Umoja é uma área de exceção em pleno território Samburu, permitindo às moradoras a possibilidade de outras escolhas. A partir da reconstrução de si e de suas vidas, elas tecem outras narrativas, de amor e de autonomia, que servirão para mulheres da África e do mundo todo.

 

 

Documentário (em francês) para conhecer mais sobre o Umoja: