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Brasil / África

A sensualidade e a graça do lundu
por Débora Armelin

 

Retrato do Lundu no Rio de Janeiro do século XIX por Earle (Foto: Reprodução/Revista de História)

 

 

Repleto de sensualidade e muito humor, o Lundu é uma canção/dança trazida pelos africanos escravizados vindos de Angola e do Congo no final do século XVII, resultado de uma mistura entre ritmos africanos com algumas características europeias, como o estalar dos dedos, a postura corpórea e o acompanhamento do bandolim.

 

O Lundu, de acordo com o pesquisador, jornalista e crítico musical José Ramos Tinhorão, tem sua origem na palavra calundu: um culto africano praticado no Brasil durante o período colonial e apontado por muitos historiadores como a formação inicial do Candomblé. O Lundu ainda é relacionado com a combinação entre umbigada africana e fandango europeu.

 

Considerado o primeiro gênero musical afro-brasileiro, o Lundu tinha como objetivo o cortejo amoroso entre os casais que se dava numa roda de batuques. A dança se iniciava com a mulher indo ao centro da roda, dançando de modo sensual e provocativo e assim despertando a atenção do homem, que se levantava para seguir seus passos. Ela, em meio ao charme e a recusa, acaba aceitando sua companhia, e é através da umbigada que esta relação se estabelecia. O corpo do dançarino executa gestos e movimentos que elucidam significados do seu contexto histórico-sóciocultural, em uma linguagem expressiva e dinâmica.

 

 

A canção de ritmo gingado, acompanhada de versos, tinha um apelo humorístico e de certa “amorosidade”. Esse gênero levanta a questão de um aspecto censurado da história da cultura colonial no Brasil, há casos em que a temática trata-se de um jogo de sedução entre o negro escravizado com a senhora (chamada assim de “sinhá”, “nhanhá” ou “iaiá”), e dessa relação vemos um discurso de desejo e violência em que essa sinhá que, ao mesmo tempo despreza esse homem, mostra uma intimidade.

 

 

 

Com o tempo, o Lundu foi se adaptando e sendo dançado em salões, bailes, circos e teatros do Brasil e do mundo (Foto: Reprodução) 

 

“Eu tenho uma nhanhazinha

De quem sou sempre moleque

Ela vê me estar ardendo

E não me abana c’o leque.”

 

 

Muito semelhante a modinha que foi difundida paralelamente em Portugal, o Lundu apresenta características marcantes e bem definidas por seus compositores e público. Essa vertente é a matriz fundamental da nossa música brasileira, sendo o Lundu considerado o gênero que influenciou o samba.

 

 

Em 1902, a Casa Edison, primeira gravadora brasileira, produziu o primeiro disco de Lundu no país, intitulado “Isto é bom” e escrito e cantado por Xisto Bahia – grande ator, cantor e compositor do ritmo. Nesta época já havia uma forte ligação entre música e teatro, conhecida como teatro de costumes, porta de entrada para músicos de onde a cultura brasileira viu surgir grandes sucessos.

 

 

Com o passar do tempo, o lundu foi se adaptando e sendo dançado em salões, bailes, circos e teatros não só do Brasil, mas alguns outros países latino-americanos como a Argentina, Uruguai, Peru, Chile e Bolívia, atingindo grande popularidade.

 

 

Com a difusão da dança, ela alcança o Norte e o Nordeste brasileiro, sobrevivendo até os dias de hoje, mesmo às escondidas. Cultivada por negros e mestiços, uma modalidade de dança de roda de Lundu mais comportado é praticada Ilha de Marajó e arredores de Belém, no Pará, agora conhecido como Lundu marajoara.

 

 

Apesar de algumas modificações feitas por meio de desdobramentos de processos culturais que fazem parte das matrizes culturais marajoaras, a importância da conservação desta dança folclórica que ajudou a definir a identidade cultural brasileira precisa ser mantida, sendo ela uma das primeiras manifestações afro-brasileiras.

 

Registro de Lundu coletado pelo escritor paulista Mário de Andrade: https://www.youtube.com/watch?v=B8BkQH13Nco]