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Senegal

Sembène Ousmane e as invenções verídicas da África
por Glaucia Oliveira


 
Trecho do filme Borom Sarret

 

 

O escritor e cineasta senegalês Sembène Ousmane pode ser considerado uma das grandes personalidades das artes no continente africano. Nascido no dia 1º de janeiro de 1923, na região de Casamance no sul do Senegal, Sembène Ousmane era um jovem com olhar crítico com relação às transformações políticas e sociais de seu país. Em 1956, já na França, ele escreve o seu primeiro romance, intitulado “Le docker noir”, livro que conta a sua própria trajetória como docker (trabalhador portuário) na França, no início dos anos 50.

 

 

A partir deste período, Sembène passa a se dedicar constantemente à arte literária. Faz viagens pela Europa para estudar e aprimorar seu trabalho como escritor, mas é na África que ele encontra as maiores inspirações para seus textos, sobretudo a sua própria região – Casamance. Segundo Sembène, ele aproveitou “a ocasião de suas várias viagens pelo mundo, exortou seus compatriotas, em particular os jovens estudantes, para voltar à África e enfrentar os problemas e buscar mudanças”.

 

 


 
Capa dos filmes Emitaï e Xala

 

 

Assim, podemos entender que Sembène considerava seu continente, sua região e seu país como uma fonte inesgotável de inspirações. E acreditava que os jovens africanos que viviam na diáspora deveriam voltar para África e realizar através de ações políticas, sociais e artísticas as mudanças que queriam no continente. No ano de 1963, ele escreve e dirige sua primeira obra cinematográfica Borom Sarret, um curta-metragem que conta as dificuldades vividas por um carroceiro no Senegal. As atividades cinematográficas de Sembène estão ligadas não só pela paixão do mesmo pelo cinema, como também por uma questão de circulação e divulgação da época, o próprio Sembène declara que “o cinema é mais prático que o romance”. Assim, a divulgação de seus ideais através do cinema era considerado por ele mais prático, razão pela qual Sembène passa a dividir suas produções entre a literatura e o cinema. Em uma entrevista à Ousseynou Diop da revista Ciné- Bulles, Sembène declara:
 
 
“Antes de fazer cinema, eu já havia publicado livros, e particularmente, eu prefiro a literatura do que o cinema. Mas os dois oferecem possibilidades de pensar, de elaborar ideias. Eu sou ao mesmo tempo cineasta e roteirista. Meus roteiros são nutridos das minhas reflexões literárias.” (tradução livre);

 

 


 
Foto: Sembène Ousmane (kamikazz)

 

 

Não gratuitamente, as obras tanto literárias quantos cinematográficas de Sembène vão ter como cenário a região de Casamance, como por exemplo o seu segundo romance Ô pays, mon beau peuple! (1957) e seu filme Emitaï (1971). Esse apreço pela terra está ligado à sua veia militante. Esta paixão pela África que nutria Sembène nasceu de seu olhar crítico com relação aos fatos ocorridos no continente africano, e, sobretudo, no Senegal. Olhar este, que como dito, foi cultivado desde os tempos de juventude.
 
 
Desta forma, Sembène Ousmane foi ganhando visibilidade no cenário cultural do seu país. Para o cineasta e escritor, a arte estava ao serviço de um interesse coletivo e de mudança social. Sada Niang, declara que: “O artista Sembène sempre clamou ao mundo a necessidade de se engajar na realidade da cidade (em que viveu). Foi um artista que considerava que a arte não poderia ser um simples exercício de criação. Para ele era, antes de tudo, um instrumento que servia para negociar as relações entre colonizado e colonizador, entre o fazendeiro e o patrão, entre o Africano récem promovido ao posto de cidadão e os novos dirigentes do país. Esta arte, segundo ele, o inspirou e o fez “beber” da história destas pessoas, da sociologia, das ciências políticas, da ideologia. É por isso que os romances e os filmes de Sembène, seus raros poemas são lidos como invenções verídicas de África colonial e pós-colonial, como apelos a uma maior atenção para as camadas mais pobres da sociedade” (tradução livre).

 

 


 
Cena do filme Le Mandat Postier

 

 

Esta veia militante de Sembène Ousmane permitiu ao leitor e telespectador um contato ainda maior com as questões causadas pelo colonialismo francês, e as necessidades de mudança das condições impostas por tal acontecimento histórico-político. O “desmascaramento da ideologia dominante” estava constantemente presente no seu ideal de autor e cineasta. Por isso suas obras ganharam destaque influenciando gerações seguintes de jovens espalhados no continente, e atraiu o olhar de críticos de cinema dentro e fora da África.

 

 


 
Cena do filme Guelwaar

Ao longo dos anos Sembène ganhou um grande espaço no cinema. Mesmo após sete anos de sua morte, seu nome é lembrado com grande respeito e prestígio. Festivais de cinema como Miroirs et Cinémas d’Afriques e Festival du cinéma de Khourigba homenageiam os ganhadores com prêmios que carregam o nome do cineasta. Sembène Ousmane não apenas é uma referência artística atemporal, mas também uma figura que tanto faz sonhar através das linhas literárias e das telas de cinema.