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Brasil / África

Meu cabelo enrolado: afro identidades positivas
por Cesar Rodrigues

 

A dupla de professores teve a ideia de sugerir aos alunos a composição de uma canção sobre a questão racial. (Foto: Luana Benatti)

 
 

Uma escola localizada em Cubatão, cidade do litoral de São Paulo, está vivendo uma experiência positiva sobre a discussão da questão racial. Desenvolvido em parceria entre os professores Luana Benatti e Cesar Rodrigues, o projeto Afro Identidades Positivas reúne alunos do 5º ano do Ensino Fundamental da Unidade Municipal de Ensino Estado do Espírito Santo que dividem suas impressões sobre o racismo.

 
 

O projeto Afro Identidades Positivas surgiu a partir da necessidade de se discutir o racismo dentro da escola, já que tal conteúdo, não obstante sua relevância e obrigatoriedade legal, não era trabalhado nas salas de aula, repetindo a realidade curricular encontrada em diversas instituições de ensino Brasil afora. Tudo começou com a constatação por parte dos professores da presença do racismo e da intolerância nas relações entre os alunos, especialmente os negros. Inúmeras formas de depreciação verbal e, algumas vezes, físicas, eram comuns entre os estudantes, com especial ênfase nas questões relativas à afro descendência.

 
 

Há algum tempo desenvolvendo pesquisas ligadas ao tema, os docentes perceberam que o foco deveria ser o racismo, especialmente na busca de alternativas de como despertar o interesse dos pequenos na abordagem da questão. Entra em cena a música, instrumento pedagógico facilitador de ações educacionais. Seguindo este caminho, a dupla de professores teve a ideia de sugerir a composição de uma canção sobre a questão racial e baseada nos marcadores identitários presentes nas ofensas depreciativas acontecidas no cotidiano escolar daquela turma, o cabelo. Nasce então Meu cabelo enrolado.

 
 

 

(Foto: Luana Benatti)

 

A metodologia se deu da seguinte forma: apresentação da música; interpretação da mensagem contida em sua letra; discussão a respeito de cada situação levantada, mediante a opinião de cada estudante envolvido; publicação das experiências na página Afro Identidades Positivas no Facebook, criada em conjunto entre o corpo diretivo da escola e os alunos; divulgação das experiências nas redes sociais para toda a comunidade escolar; criação de ações concretas de combate ao racismo dentro da escola e por fim,  estabelecimento de uma ligação interdisciplinar da questão racial com os demais conteúdos curriculares.

 
 

De maneira surpreendente, as primeiras mudanças começaram a aparecer. Aos poucos, meninas e meninos do 5º ano “A” perceberam o comportamento negativo em relação à questão racial. A partir daí tinha início uma pesquisa sobre os vários tipos de cabelo para em seguida analisá-los como como herança afro, sendo motivo de orgulho. Dessa descoberta outras percepções foram sendo afloradas, por exemplo, a afro identidade passou a ser assumida positivamente. Experiências vivenciadas e presenciadas nas quais o racismo estava presente foram trocadas entre todas e todos, sendo que muitos questionamentos a respeito da falta de oportunidades igualitárias em todos os setores da sociedade foram trazidos à discussão em sala de aula, todas levantadas pelos alunos. De maneira paulatina e reflexiva, as atitudes discriminatórias foram sendo observadas por elas e eles, sem que passassem ao largo de discussões críticas para a resolução do problema, deixando claro que tais eventos não poderiam mais perdurar naquele grupo.

 
 

 

(Foto: Luana Benatti)

 
 

A repercussão foi tão grande que, por iniciativa própria, os alunos tiveram a ideia de construir cenas teatrais a partir das quais pudessem convidar mães, pais e demais membros da comunidade escolar para falar sobre o assunto. Assim o fizeram, construindo uma apresentação para toda a escola com cenas teatrais que evidenciavam casos de racismo. Após cada cena, uma aluna, no papel de interlocutora, ia à plateia comentando as situações apresentadas e pedindo para que as pessoas se posicionassem a respeito.

 
 

Essa atividade serviu como fechamento de todas as experiências vividas durante o ano de 2015. Há que se ressaltar que a maioria das ações estão disponíveis na página Afro Identidades Positivas no Facebook. Para os professores, realizar essa experiência foi mais uma prova de que a questão racial está presente a todo o momento nas salas de aula e, por conta dessa presença, necessário que sejam abordadas com seriedade, comprometimento e muita coragem. Talvez seja esse o caminho mais fértil à uma sociedade mais igualitária e próxima de uma justiça social.

 
 

Positivar as afro identidades nada mais é do que avançar na luta pelo reconhecimento do que é ser brasileiro. É pensar num país onde outros referenciais raciais estão presentes na formação do cidadão. É dar espaços para que alunos passem a proferir depoimentos como, por exemplo, esse:  “…eu acho que a minha origem é uma origem da qual tenho muito orgulho… por que, tem gente que ainda tem preconceito… mas, acho que quem tem essa minha cor, sabe do que eu estou falando…ah! É uma coisa muito legal”. É avançar no pensamento de que a escola ainda tem muita coisa a oferecer à sociedade e que ela seja o caminho mais eficaz no combate às desigualdades e reconhecimento das diferenças inerentes às configurações sociais contemporâneas.

 
 

 
 

Poema de uma aluna sobre a negritude:

 

“Cultura de raça, com muita festaça e também com um povo em ruaça, essa é minha origem

A origem de um povo digno do que plantou, colheu e o que conheceu

Muitas batalhas pela sua liberdade, não liberdade de roubar, matar e ser condenado a morte

E sim uma liberdade de poder cantar, comer, festejar e comemorar pela sua liberdade

De ser quem eu sou, de estar onde estou, pelo fruto do meu povo

A cor da minha pele é minha identidade, o meu cabelo é o meu povo e o meu caráter é minha origem…”

 
 

Conheça a página do Afro Identidades Positivas no Facebook:

https://www.facebook.com/Afro-Identidades-Positivas-914245701944166/

 
 
Cesar Rodrigues é professor e autor da tese de doutorado: “Corpos e Culturas invisibilizados na escola: racismo, aulas de Educação Física e Insurgência Multicultural.”