O curta fomenta uma discussão mais profunda sobre os negros que habitam regiões majoritariamente brancas e com culturas completamente diferentes das presentes em África. (Foto: Reprodução)
Durante o século XX, a Europa recebeu um grande número de imigrantes oriundos de ex-colônias como Nigéria e Gana (ex-colônias inglesa), Costa do Marfim (ex-colônia francesa), entre outras, que se mudaram para o exterior com o intuito de estudar e também fugindo de ditaduras que ainda dominavam muitas países em África.
Os picos de imigração ocorreram principalmente nas décadas de 60 e 70 e iniciaram a formação de uma nova comunidade de africanos no exterior, esta que com o início do século XXI abre espaço para jovens negros nascidos em solo europeu e que enfrentam os desafios de possuírem uma dupla nacionalidade.
Pegando carona neste fenômeno e para fomentar uma discussão mais profunda sobre os negros que habitam regiões majoritariamente brancas e com culturas completamente diferentes das presentes em África, o documentário Uma Conversa sobre a Identidade Afro-europeia reúne três mulheres negras, que ao se identificarem tanto como africanas quanto como europeias, falam sobre a relação com a dupla nacionalidade e o convívio em sociedade.
“O curta é composto por entrevistas com mulheres negras que se consideram africanas e europeias. O objetivo do debate é ir fundo nos conflitos de identidade enfrentados por pessoas com mais de uma nacionalidade e ao mesmo tempo nenhuma,” explica a belgo-congolesa Naomi Mabita, idealizadora e diretora do documentário em entrevista ao Afreaka.
Naomi explica que tudo começou quando recebeu uma mensagem de uma amiga nascida em Gana, mas que atualmente vive na Itália para assistir uma palestra sobre identidades. “Eu não tinha lido nada sobre o assunto, mas estava curiosa de como Benja se sentia acerca de sua identidade e então fomos assistir. Em seguida perguntei se ela não gostaria de criar algo juntas. Criamos. No processo de concepção buscamos reunir mulheres negras que tinham muito a dizer e sabiam se expressar. Pensamos em personagens que conseguissem dividir suas angústias e experiências.”
Ao longo de 20 minutos, uma norueguesa de origem nigeriana, uma italiana de origem ganense e uma belgo-camaronesa falam sobre as dificuldades enfrentadas ao se reconhecerem tanto como europeias quando como africanas. Ao longo do filme elas discutem o isolamento social causado por uma visão estereotipada e a dificuldade de se considerar originária de uma país europeu. De acordo com Naomi, o filme é também sobre suas próprias inquietações.
“Eu sou congolesa, cresci na Espanha, Peru e Bolívia, mas ainda não consigo expressar minha relação com a nacionalidade, então entrevistar outras pessoas é um modo de me conhecer melhor e aprender com diferentes pontos de vista sobre nacionalidade enquanto tento encontrar a minha”, explica Naomi.
Naomi completa afirmando que o documentário Uma Conversa sobre a Identidade Afro-europeia é importante por apresentar ao público um recorte diferente do habitual. Ao se descolar de países como a Inglaterra e França, tradicionalmente usados como regra para exemplificar a vida do negro europeu, o documentário se aprofunda e expõe os conflitos identitários presentes em regiões pouco abordadas, como a Noruega. A diretora faz questão de deixar clara sua insatisfação com a invisibilidade de africanos ou descendentes de africanos vivendo em outros países do continente.
“Todas se demonstraram muito interessadas em falar sobre o assunto. Muito se discute sobre o negro nos Estados Unidos e Inglaterra, contudo pouco se fala sobre os homens e mulheres negras que vivem em outros países europeus. Nós tentamos suprir estas necessidade com um pouco de experiências de vida que lembram as pessoas que nós existimos,” pontua a diretora belgo-congolesa Naomi Mabita.
*Naomi Mabita é uma mulher negra nascida no Congo e atualmente vive no Reino Unido onde trabalha com vídeo e cinema, sempre relacionado com o público negro.
Confira o documentário na íntegra em inglês: https://vimeo.com/156289117