width="62" height="65" border="0" /> width="75" height="65" border="0" /> width="75" height="65" border="0"/> /> /> /> />
Brasil / África

Cultura Afro-brasileira na galeria de arte: “Objeto/Oriki: corpus e habitus = arte”
por Rafael Gonzaga

 

Foto: Divulgação

 

 

Antônio Sérgio Moreira, natural de Belo Horizonte, é um artista plástico autodidata com um extenso histórico na tradição artística nacional. Desde 1986, participou de diversas exposições individuais e coletivas, colecionando alguns prêmios. Entre eles destacamos o Prêmio Acrilex do Salão Bunkyo (1991), a Medalha de Prata da Accademia Inter. D Roma (1991), a Honra ao Mérito pelo Gunther Museu de Arte Contemporânea de São Paulo (1993) e o II Prêmio Nacional de Expressões Culturais Afro-brasileiras pela exposição “Objeto/Oriki: corpus e habitus = arte”.

 

 

O nome da exposição é sugestivo, uma vez que o artista buscou as sonoridades/linguagens de povos Yoruba como base para pensar e criar sua própria arte. A exposição reúne diversas formas de linguagens que reproduzem vivências com culturas africanas e afro-brasileiras. Sérgio Moreira intenciona aproximar experiências de outros cosmos ancestrais à vida do observador e sua própria experiência no presente.

 

 

 

Foto: Divulgação

 

 

Por isso, segundo o artista, a palavra de origem Yoruba Orí remete à cabeça=destino e Oriki à saudação=ancestralidade. Habitus/corpus seria uma forma de trazer para o campo da sua criação tudo aquilo que está relacionado ao corpo, não apenas o individualizado do Eu ocidental, mas como parte de um corpo ancorado na comunidade, isto é, o corpo e a comida, e a arte, e a religiosidade, e outros corpos, e animais e, e, e…. Assim, as palavras que dão nome à exposição são associadas às experiências espirituais e formam uma trama densa que levam àqueles que as ouvem para outros planos existenciais.

 

 

Igualmente, na tradição cultural, artística, mítica e religiosa africana e afro-brasileira, o corpus e o habitus atravessam todas as dimensões da vida. Eles dão substância para o agir e o conhecer. Não se trata de uma concepção na qual existe o mundo independente do homem e, separados, a consciência sobre este. Não há separação, ambos se fundem em uma única entidade. Somente através do habitus/corpus é que podemos falar sobre essa entidade, conhecê-la, e mesmo dançar no mundo o qual, por sua vez, só pode falar, conhecer e se deixar seduzir através do corpo vivo que sente e lhe dá significado.

 

 

 

Foto: Divulgação

 

 

Assim, a palavra Oriki, por exemplo, não é apenas uma forma de comunicação, mas também palavra mágica, como poesia, que funciona como um “modem” que liga cosmos distintos e memórias recentes às memórias ancestrais através da sonoridade\ritmo. São como os ‘bolinhos Madeleine’ de Proust, que transportam aqueles que a vivem para outros tempos, outras margens e “sistemas” lógicos distintos. Tal palavra constitui tramas e realidades complexas, tão materiais quanto a nossa “realidade” aparentemente tão óbvia, repetida e cotidiana.

 

 

Assim, objetos mundanos ou arte, Oriki como a cabeça que vê, pensa e fala não são dissociadas do corpus que vive e habita – não no mundo, mas entre o mundo. Aqui, percebemos como a concepção de vida de povos Yoruba se aproxima da filosofia, por exemplo, de Friedrich Nietzsche, que buscava justamente reencontrar o corpo na vida e abandonar a fria racionalidade cartesiana, transformadora de homens em robôs automatizados na modernidade.

 

 

 

Foto: Divulgação

 

 

É por isso que, em uma entrevista, Sérgio Moreira afirma que para ver festas no terreiro não basta olhar, mas habitar com o corpo aquele território, isto é, não basta entrar em um terreiro para ver se o que acontece é real ou não. Para que aquele mundo faça sentido é preciso que o terreiro esteja habitando o corpus de quem olha. Deste modo, na exposição, ao reunir experiências com esse mundo, Antônio Sérgio Moreira não propõe um simples exercício de observação à distância, mas um profundo ver, ouvir e sentir, viajar com nosso corpus/habitus rumo à outra margem, vislumbrar essas memórias que pulsam em nosso espirito, em nossa história e cultura afro-brasileira.