A distância entre Brasil e África do Sul parece ter ficado para trás. No ano passado, a matéria do Estadão, Em uma década, relação do Brasil com a África avança, mas enfrenta críticas, apontava que, quando o ex-presidente, Luis Inácio Lula da Silva, visitou o continente africano, o Brasil, começou, efetivamente, a se reaproximar da África do Sul, em busca de união. Como primeiro país africano a sediar a copa, em 2010, o coração do mundo provou aos que duvidavam da sua capacidade, seu potencial econômico e abriu os olhos do mundo para as riquezas naturais e urbanísticas de cidades como Cape Town, Johanesburgo, Port Elizabeth, Pretória e Durban.
Cidade do Cabo
Aquela África do Sul, antes vista somente pelas janelas dos problemas sociais, mostrou tamanha riqueza em seu solo e na sua cultura que, no show do encerramento da copa, passou ao Brasil a difícil responsabilidade de realizar o próximo evento mundial a sua altura. O conjunto de imagens, sons e cores que buscava representar a energia de um povo que, apesar da luta diária, não perde a alegria, lembrou ao brasileiro a sua origem e que, na verdade, ambos africanos e brasileiros nada mais são do que irmãos que foram separados por um longo período e que se reencontraram e que, naquele momento, precisavam seguir juntos para enfrentar grandes desafios.
Donos de largos territórios e biodiversidade, de um povo receptivo e apaixonado pelo futebol, a África do Sul e o Brasil passam por um momento especial em suas histórias. Com a consolidação da democracia e o fortalecimento de suas economias, são vistos como países de destaque no cenário mundial. Se grupos como o G-3, destinados aos países considerados de primeiro mundo, não podem abranger os em desenvolvimento, cabe aos próprios o fechamento de acordos bilaterais e multilaterais. Grupos como BRICs (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), e IBAS (Brasil, Índia e África do Sul) propõem políticas de cooperação mútua como fundamentais para o crescimento econômico e social.
Estádio Moses Mabhida – Durban, África do Sul
No Brasil, estudiosos e especialistas buscam compreender os diversos fatores que envolvem essas ‘novas’ relações internacionais. A professora Analúcia Pereira, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, formada em relações internacionais e doutorada na África do Sul, possui um grupo de estudos africanos e diversas publicações a respeito. Para ela é preciso que o Brasil passe a estudar o continente Africano a partir da perspectiva do próprio país. “A visão estereotipada do Brasil com relação aos países africanos se deve, pelo fato da África ser estudada a partir da perspectiva brasileira, enquanto que este país possui uma história anterior a existência do Brasil, ou seja é muito mais complexo do que se parece”, diz.
Ela explica que há muitas vantagens nesses acordos, referente ao IBAS. Ela relembra que a África passa a ser um eixo, uma conexão com a Ásia, e abre possibilidades de exportações. Também nas questões comerciais, impulsiona a exportação e internacionalização de grandes empresas brasileiras que começam a adentrar no país africano para suprir variadas demandas. Cita como exemplo a Marcoplo, uma empresa de carrocerias para ônibus e veículos, da qual a África é um dos principais compradores. “Essa relação é benéfica para o Brasil, que aumenta suas exportações, e benéfica para África, que importa determinados bens que ainda não produzem com tanta agilidade”, explica.
A África do Sul, a partir dos acordos com o Brasil, passa a ser incluída fortemente no mercado mundial e vista como economia de impacto. A professora destaca também o papel fundamental das políticas diplomáticas que ajudam no controle de determinada áreas onde os países fazem margem a exemplo a costa do Atlântico Sul, um espaço rico e com grandes possibilidades de exploração econômica.
Referente aos índices, alguns dados do IBGE Países mostram curiosidades do país em relação ao Brasil. Embora haja uma diferença expressiva no PIB dos dois, sendo o do Brasil de U$ 2.476.651 milhões e o da África do Sul de apenas U$ 408.237, o Brasil gasta apenas 5,7% do PIB em educação, apenas 0,2% a mais que o país africano. Já com relação ao recebimento de turistas, o Brasil fica pra trás, em 2010, a África do Sul recebeu 8.074.000 contra os 5.161.000 milhões que visitaram o Brasil.
Ainda assim, no Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, que mede a qualidade de vida dos seus habitantes, ambos encontram desafios. O Brasil, apesar de ser considerada a sétima economia do mundo, ocupa o 85° lugar, com 0,73 e a África do Sul, o 121°, com 0,62. Aos dois países, portanto, cabe a missão de conciliar crescimento econômico com a responsabilidade social. Juntos começam uma operação resgate, não somente no quadro econômico, mas também no cultural e no social. Novas metas passam a serem estabelecidas em fóruns, debates e criações de protocolos, medidas de incentivo no comércio, projetos de trocas de tecnologia e de preservação ambiental para garantia de um desenvolvimento sustentável. No último quesito, o Brasil exportará projetos de sucesso da África do Sul para ajudar na preservação das riquezas naturais.
Com não obrigatoriedade de visto para circulação entre ambos os países, acontece o intercâmbio entre africanos e brasileiros e propicia trocas culturais importantes neste processo de união. Para Analúcia, a copa do mundo é um evento essencialmente estratégico para as relações diplomáticas entre os países e assim como em 2010, na África do Sul, chega ao Brasil com as mesmas possibilidades de mudar a visão do mundo sobre a nação.
Outros projetos oferecem bolsas a estudantes africanos para vir ao Brasil, segundo a professora, esses africanos que entram aprendem com os brasileiros a diversidade. O conjunto e o acompanhamento destas relações, sendo disseminada pela mídia, faz com que a população brasileira passe a enxergar a importância da África do Sul, de modo que ambos os países mudem o olhar de um para o outro. “Pode haver diversas diferenças entre as duas culturas, mas eu observo que os brasileiros e os africanos se relacionam muito bem, e que eles gostam da nossa mistura, acredito que estão cansados da segregação racial existente na África”, conta.
Cape Town, África do Sul
Quanto ao futuro, a professora Analúcia espera que ambos os países se tornem soberanos “São países muito ricos nas questões naturais e culturais, eu espero que eles possam unir forças e que, como resultado, venha beneficiar quem realmente interessa, a população”, conclui.
*Primeira da reportagem da série Brasil-África do Sul, por Patrícia Costa. Na próxima reportagem, conheça um casal sul-africano que implantando uma fazenda orgânica em Eastern Cape, passou a colaborar com o desenvolvimento sustentável da região.