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Brasil / África

Antropofagia Afro-Brasileira
por Gustavo Souza

 

Berimbau, um dos instrumentos de influência africana

 

 

Criado pelo escritor paulista Oswald de Andrade, o Movimento Antropofágico foi uma manifestação artística ocorrida no Brasil na década de 1920. A inspiração de Oswald veio dos ideais da Poesia Pau-Brasil, movimento encabeçado por Tarcila do Amaral e que visava criar uma poesia de exportação. A partir disso o escritor propôs que se formasse no Brasil um movimento que deglutisse a cultura do outro extremo, fazendo uma devoração cultural das técnicas importadas para reelaborá-las com autonomia, convertendo-as em produto de exportação. Os conceitos propostos por Oswald de Andrade são até hoje vistos como um dos maiores marcos do modernismo brasileiro, e apontados até mesmo como uma saída para o problema de identidade nacional e antídoto contra o imperialismo.

 

 

 

Outro grande influência africana, o samba hoje está atrelado a cultura brasileira

 

 

No entanto, embora apontem as raízes do movimento antropofágico à Semana de Arte Moderna de 1922 e aos ideais modernistas levantados ali, a antropofagia cultural na sociedade brasileira começou muito antes. Séculos antes. Com um breve olhar sobre os hábitos e costumes dos brasileiros pode-se perceber como a cultura indígena, a cultura dos portugueses, dos italianos e, principalmente, a cultura trazida dos países da África influenciaram o país, moldando e inspirando seus cidadãos até os dias de hoje.

 

 

A população adaptou à moda brasileira as cantigas africanas, e eis que daí surge o samba, tido como o mais brasileiro dos estilos musicais, e a bossa-nova, tida como a mais nobre das manifestações musicais autenticamente brasileiras. Instrumentos como o berimbau, atabaque, cuíca e banjo também foram criados em terras brasileiras a partir da herança trazida de África. A presença africana é encontrada ainda nos ritmos das danças, como o lundu, estilo que originou o que se conhece atualmente como forró, além de diversos outros gêneros musicais genuinamente brasileiros (ou seriam eles antropofagicamente brasileiros?!).

 

 

 

A feijoada e a influêcia culinária

 

 

Apesar da música ser reconhecida como um dos elementos que mais aproximam Brasil e África, a cozinha tupiniquim, baseada desde o princípio nas tradições do continente africano, não fica atrás. Sinônimos de Brasil nos quatro cantos do mundo, a caipirinha e a feijoada foram trazidos à existência pela inventividade africana nos campos de trabalho do Brasil. Durante o período da escravidão os chamados senhores de escravos não comiam as partes consideradas menos nobres do porco (orelha, rabo e pé), que rejeitadas pela “casa grande” tinham grande valor para os escravos, que com uma alimentação baseada apenas em cereais, resolveram pegar as partes não utilizadas do porco para misturá-las com o feijão. O Brasil herdou de África os hábitos alimentares, e hoje os exporta ao mundo como produto nacional

 

 

No campo religioso, aproximadamente 4 milhões de brasileiros atualmente praticam alguma forma de religião de matriz africana. Além disso, identifica-se o sincretismo religioso em diversas manifestações artísticas, sociais e culturais de nossa sociedade. É possível encontrar, por exemplo, referências às divindades africanas em todas as vertentes da música brasileira. Conceito que também se estende a culinária. Muitas comidas originalmente sagradas, como o acarajé e a tão popular farofa, hoje fazem parte do cardápio nacional. A influência das religiões de matriz africana está até mesmo no vocabulário nacional, encontrando alusões em palavras como babá, faca, tijolo, muamba, caô e por aí vai.

 

 

 

O acarajé, hoje um dos clássicos da Bahia

 

 

Outra contribuição africana, menos comentada, é a botânica. Diversas árvores, folhas e frutos que hoje fazem parte da flora nacional (assim como dos hábitos da população) são oriundas da África e se adaptaram perfeitamente ao solo brasileiro. Destaque para o coqueiro, melancia, gergelim, quiabo e o nosso tão querido café.

 

 

 

Nosso português é repleto de palavras africanas

 

 

A energia africana está presente na alma de todos os brasileiros. Seja na culinária, na pluralidade musical, em nomes de ruas e no uso das palavras. O brasileiro está em constante contato com os hábitos e costumes trazidos de África, os adaptando à realidade momentânea (ou, como diria Oswald, os deglutindo). Hoje, é possível afirmar que foram criadas verdadeiras manifestações afro-brasileiras, em diversas áreas e de diversas formas, e que o Brasil é fruto de cada uma delas. O processo antropofágico se iniciou muito cedo, e tomara que ele não termine. Pelo nosso bem, e pela memória dos nossos antepassados.