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Brasil / África

Aline Ramos inspira e empodera mulheres negras com blog “Que nega é essa”
por Sérgio Viana

“O que sempre tive em mente é que eu deveria utilizar conceitos teóricos e debates políticos, que por sua natureza são pesados para traduzir isso para uma linguagem fácil e acessível.”

 

 

Há uma ou duas décadas, a comunicação vem se tornando cada vez mais enigmática, afinal, a cada dia os limites de possibilidades para se criar novos canais e formas de trocar informações tem se afastado da nossa capacidade de enxerga-los. Quem trabalha com a comunicação hoje, além de ter mais ferramentas de atuação profissional, também tem mais oportunidades e subsídios para se dedicar às causas, ideais e lutas. Neste cenário, os jovens são a fatia que mais se apropriou destas novidades para falar o que bem entendem, contrapondo assim o pensamento muitas vezes engessado da mídia tradicional.

 

 

Aos 24 anos, Aline Ramos se formou recentemente no curso de Comunicação Social – Jornalismo, pela Unesp/Bauru no interior de São Paulo é o exemplo perfeito disso. Ela decidiu explorar a necessidade de produzir seu trabalho de conclusão de curso (TCC) em dois assuntos muito importantes: a luta pelo empoderamento feminino e a luta contra o racismo. Aline é uma jovem mulher negra, mas que já sofreu diversos preconceitos e aprendeu a lidar com eles para o seu próprio bem e o de outras mulheres.

 

 

Assim como a maioria da população afro-brasileira, ela sente a falta de ensino e conhecimento sobre a sua ancestralidade. “Eu não conheço a minha história e as pessoas negras próximas a mim também não conhecem. Minha mãe sempre contou que meu bisavô era escravo e minha bisavó era índia, mas as histórias paravam nisso. Eu nunca vou saber de qual país africano a minha família descende e quais eram as características desse povo”, comenta.

 

 

 

“Para as mulheres sentir que são bonitas e reconhecer-se desse modo é fundamental, por isso busco esses referenciais que são poucos e não existem na mídia.” (Foto: Driely Schwartz)

 

 

Para a jornalista, é de grande importância que o conteúdo passado aos alunos nas escolas de ensino fundamental e médio seja repensado para contemplar a História e a Cultura afro-brasileiras e africanas – ressaltando que já existe a Lei 10.639/03, que obriga tais abordagens nas escolas. “Infelizmente leis não resolvem tudo, ela já tem mais de dez anos e pouca coisa mudou. Por isso a importância de mudar a cultura do Brasil. Os negros enriqueceram demais a cultura brasileira e são poucos reconhecidos”.

 

 

No segundo semestre de 2014, Aline lançou o blog “Que nega é essa?”  e, no Facebook, sua página oficial, onde busca estabelecer um forte fluxo de conteúdo positivo a respeito da identidade da mulher negra, que, segundo Aline, são constantemente ‘invisibilizadas’ na sociedade. “A mulher negra é anulada quando só aparece na novela nos papéis de empregada, prostituta e mulheres “fáceis”, extremamente sexualizadas. Ela é anulada quando não está nos telejornais e só aparece no período de carnaval se estiver com o corpo descoberto. Quando cheguei a adolescência sempre ouvia que eu poderia ser uma Globeleza como um elogio. Parecia que meu único destino como mulher negra era expor meu corpo para conseguir determinado tipo de sucesso. Ainda bem que descobri que não era só isso, e que eu poderia ser muito mais do que era mostrado a mim. Minha busca não é só pelo empoderamento individual, mas o de outras meninas e mulheres. Desejo ir longe, mas não quero ir sozinha”, argumenta.

 

 

Uma das ações feitas através do projeto “Que nega é essa?”, que trazem mais retorno e empolgam sua criadora, é a postagem de imagens que ressaltam a beleza e o valor das mulheres negras. São fotos, muitas vezes selfies, que fogem a diversos padrões de beleza de uma sociedade patriarcal e racista, mas que para Aline e suas companheiras espelham a grandeza da mulher afro-brasileira.

 

 

“Os negros no Brasil primeiro tiveram de lutar pela abolição da escravidão, depois pela conquista de direitos civis e humanos e atualmente continuam a militar por essa luta, mas também buscam que a sociedade entenda que o negro é belo. O conceito de beleza é uma construção histórica e ele acompanha o racismo contido nessa periodização. Essa tomada de valorização da beleza negra é fundamental para o empoderamento dessa população. Existem diversos meios para se combater o racismo, o campo estético é um deles. Para as mulheres sentir que são bonitas e reconhecer-se desse modo é fundamental, por isso busco esses referenciais que são poucos e não existem na mídia”, defende. As fotos são encontradas por Aline em grupos e outros espaços nas redes sociais, mas muitas jovens também tem enviado suas fotos a ela voluntariamente para serem expostas.

 

 

Por meio de seu conteúdo, Aline Ramos se preocupa em atingir a maior parte possível de mulheres negras que se identifiquem com suas ideias. Ela sabe que apesar dela mesma ser mulher e negra, está longe de compreender e poder representar suas semelhantes em totalidade. “Estudei numa universidade pública e isso me distancia da realidade de muitas mulheres negras que moram na periferia, por mais que eu tenha morado em uma durante um período da minha vida. As redes sociais servem para eu estabelecer um diálogo e entender quais são as diferenças entre nós e quais são essas demandas. O que sempre tive em mente é que eu deveria utilizar conceitos teóricos e debates políticos, que por sua natureza são pesados para traduzir isso para uma linguagem fácil e acessível. Meu parâmetro é quando minha mãe ou minha prima leem algo que eu escrevo e se identificam”, complementa.

 

Longe de se sentir satisfeita com os resultados positivos que alcançou até agora, Aline ainda pretende expandir muito mais o seu projeto e a variedade de informação que gera.  Ela já pensa em criar um vlog através do Youtube, num programa de web rádio e a produção de um livro com perfis de mulheres negras. Sua atuação demonstra que o trunfo principal é a consciência que tem de si própria e da diferença que pode fazer.

 

 

“Para viabilizar tudo isso também pretendo buscar uma forma de capitalizar o projeto para que eu consiga mantê-lo, seja com patrocinadores ou algum edital que o meu projeto se encaixe. Uma coisa que aprendi é que trabalho não vai faltar”, finaliza.

 

 

Acesse a página do Que Nega É Essa: https://www.facebook.com/quenegaeessa/?fref=ts