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Burkina FasoA Caravana do Deserto pela
Paz e pela Reconciliação
Texto e Fotos: Flora Pereira da Silva
Arte: Natan Aquino

 

 Extinguindo um modo de vida milenar, os últimos séculos testemunharam o fim das grandes caravanas trans-saharianas que viajavam do sul do Marrocos a Timbuktu, no norte do Mali. Com o fim das caravanas, a região passou a enfrentar um desafio ideológico. As dificuldades da vida no deserto trouxeram fenômenos como a migração, conflitos, problemas econômicos e instabilidade política. Para lutar contra a erosão do patrimônio cultural e do conhecimento local, nasce no Mali, em janeiro 2001, o Festival do Deserto. Um momento para comemorar e relembrar os encontros anuais históricos da cultura Tuareg. A festa original, conhecida como Takoubelt ou Temakannit, simboliza o final da temporada nômade, quando os povos se encontravam para trocar novidades, bens materiais e cantos. Festividades, que também se consagraram como um importante lugar para tomada de decisões e encontros comunitários. Hoje, o festival celebra a cultura local, regado de poesia, música, dança e costumes tuaregues, incluindo passeios de camelo e outros jogos tradicionais.

 

 

Após as três primeiras edições, o evento passou a ser realizado na cidade de Essakane, 65 km de Timbuktu e foi aberto pela primeira vez para os artistas de outras regiões do Mali, em seguida, para os artistas africanos e eventualmente para o resto do mundo. Considerado genuíno e único, devido à importância da cultura tradicional presente, o festival passou a atrair especialistas em música, turistas e curiosos dos sete mares, sendo hoje considerado um dos mais importantes festivais internacionais. Durante três dias, dezenas de grupos artísticos apresentam sua arte e incentivam um diálogo de paz, o intercâmbio cultural e a proteção ambiental de toda a região. Com o conflito e a crise do Mali em 2013, o festival não conseguiu permissão para ser realizado, uma vez que o norte do país, região onde tradicionalmente acontece o encontro, ainda não está 100% seguro. No entanto, mesmo com dificuldade de estruturação e financiamento, os organizadores não desistiram. A mensagem de paz, mais do que nunca, precisava ser levada adiante.

 

 

Juntando-se a outros dois grandes festivais do continente ‘Festival Taragalte’ do Marrocos e ‘Festival sur le Niger’ da região sul do Mali e com a colaboração dos países vizinhos criaram ‘A Caravana Cultural pela Paz e pela Reconciliação’, uma expedição cultural para levar o festival além de suas fronteiras, e de maneira eficaz, propor uma resistência não-violenta contra a intolerância. Além de, através da música, oficinas e exposições de arte, trazer às pessoas do Saara e da região do Sahel uma plataforma de encontros e de trocas de ideias para preservação do patrimônio artístico. A caravana começou no norte de Burkina Faso, e percorreu diferentes regiões do país, onde estavam instalados os campos de refugiados malianos, e terminou em Segou fundindo-se com o Festival sur le Niger. O objetivo era levar uma mensagem de paz aos deslocados e refugiados nos acampamentos de Burkina Faso, instando-os a voltar para a pátria e tomar lugar no desenvolvimento da nação do Mali.

 

 

Considerado como um símbolo de restauração da paz, a Caravana no país vizinho criou um espaço de diálogo e reconciliação entre o norte e o sul do Mali, se definindo como um projeto unificador e de tolerância entre os povos através da arte. O papel desempenhado pelo evento não foi apenas econômico, mas sim cultural, conectando e colocando em contato diferentes povos para um momento de trocas de música, poesia, arte e de estilo de vida. “Essas atividades aproximam as pessoas, ao desenvolver a consciência de outras culturas e criar formas inovadoras de trabalhar em conjunto e resolver desafios difíceis. Isso é exatamente o papel da caravana. Isso é o que queremos revitalizar e revalorizar”, explicou Halim Sbai, diretor do Festival Taragalte. Em Laongo, a 30 km da capital Ouagadougou e ao lado do campo de refugiados de Sagnogo, uma das sedes que recebeu a Caravana, o clima não era outro. A música estava ali para vencer a guerra, e os músicos eram seus soldados. O clima era de reconciliação onde todos estão juntos pela paz. Paz que virou êxtase, levando as pessoas a dançarem freneticamente a cada apresentação em um grito desabafado de união onde a guerra não consegue parar a cultura.

 

 

A caravana, que é composta de 80 artistas, trouxe a Laongo 23 artistas malianos, 15 marroquinos e diferentes músicos burkinabès. O grupo tuareg ‘Amanar’ foi o primeiro a se apresentar, e com a música envolvente o público foi se aproximando. Quando todos já estavam aquecidos, foi a vez do ‘Le Voix du Mali’, um grupo multiétnico de jovens talentosos, que misturam em suas composições todos os instrumentos e ritmos culturais malianos. Do Marrocos, o destaque foi a “Génération Taragalte”, responsável por levar o público à pista de dança em frente ao palco. Duas cantoras de peso ainda brilharam na noite, a veterana Khaïra Arby e a mais recente ganhadora do prêmio de destaque da música do oeste africano, Mariam Koné. Para Koné, a caravana é um lugar de esperança: “Nós somos a voz dos sem vozes, podemos dizer alto o que os outros pensam baixo. Através da música, podemos dizer em harmonia o que queremos: um Mali unido, não em prantos. A música se faz na alegria e assim a mensagem é passada. A mensagem de que ‘isso nunca mais’. Esta noite, três festivais se dão as mãos para fazer algo pela crise do Mali. Através deles o mundo saberá que o povo maliano luta pela paz”.

 

 

Quem fechou a noite com chave de outro foi um artista local, o badalado burkinabè Sana Bob. Ao se apresentar, o público foi à loucura. Com seu estilo fusion de música tradicional e reggae, o agito tomou conta do festival. Todos se levantaram e a pista ficou energizada. Sana Bob, que é sucesso nacional, também trouxe ao palco sua mensagem de paz: “os povos da África do Oeste são irmãos, falamos a mesma língua, fomos divididos pelos colonizadores, mas as fronteiras não são reais. Não é possível falar de paz em Burkina Faso se não há paz no Mali. Somos todos irmãos, juntos pela mesma causa. A paz é feita de união, sem fronteiras. A música é um instrumento da paz e a palavra é feita para comunicar o perdão”.

 

 

Manny Ansar, diretor do Festival do Deserto e responsável em sua admirável resiliência pela concretização da Caravana, comenta que a noite é uma mensagem de negação de qualquer movimento que pulsa de intolerância, incompreensão e violência: “Estou na música há 20 anos, e já vi todos os tipos de pessoas, de todas as cores e culturas, de todos os países do mundo. E por todos esses lugares, eu vi que a única coisa que une as pessoas, e os coloca em um mundo sem fronteiras, é a música. De modo particular, no Mali, isso é ainda mais forte. Porque são os músicos os intermediários entre os vilarejos e entre os nômades quando existe um conflito. Eles conseguem unir as pessoas, criando o primeiro contato para a recuperação de confiança entre os povos. E em seguida, vem a paz. A música não pode parar. É essa a mensagem”.

 

 

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